A Meta 2 do CNJ tem sido criticada por juízes de alguns estados e da Justiça Federal, e até mesmo no seio do STF.
Para mim, o que mais preocupa é que a ênfase da Meta 2 está na quantidade, está em resolver um problema de números. Quando alguém fala em qualidade, é para dizer que para se alcançar a Meta 2 não se poderá esperar que as decisões judiciais sejam tão boas. Como disse Miguel Kfouri Neto, nesta entrevista,
juiz não é máquina. Sentença não se faz alimentando o computador e esperando sair algo pronto. Exige trabalho, pesquisa. Além disso, é preciso amadurecer a decisão, debruçar-se sobre a questão.
Claro que algo deve ser feito, para se reduzir a quantidade muito grande de processos que tramitam no Poder Judiciário. Mas fico incomodado em perceber que, ao invés de se dar primazia a aspectos qualitativos, nós estejamos nos contentando com elementos exteriores. Certamente, ao final, serão divulgados os números (sempre eles…) alcançados com a Meta 2, e todos comemorarão. Mas a vida das pessoas não é apenas um número. Quando alguém vai ao Poder Judiciário, não espera apenas uma decisão proferida rapidamente – qualquer que seja o resultado. Ao se “resolver” tudo com a Meta 2, esquece-se (ou, pelo menos, deixa-se de lado) de investigar a causa da morosidade dos processos.
E assim vai-se vivendo, e começamos a aceitar não o Poder Judiciário que desejamos, mas um Poder Judiciário “sustentável”. Mas sustentável é pouco, como diz Denis Russo Burgierman:
Mas acontece que ser sustentável, apesar de ser um bom começo, não é suficiente. É o que disse o arquiteto Mitchell Joachim, sobre quem vou falar mais esta semana. “Eu não gosto do termo”, ele disse numa entrevista à revista americana Wired. “Não é evocativo o suficiente. Você não quer que seu casamento seja sustentável. Você quer que ele seja evolutivo, enriquecedor, interessante.” Sustentável, apenas, é miseravelmente pouco.
Mas não é só em relação ao Poder Judiciário que isso acontece. Parece que é comum, entre nós, esse método: os grandes problemas são analisados parcialmente e, se encontro na parte analisada algum dado interessante, uso-o em proveito de meu argumento, com o intuito de dissimular os vários problemas que ainda tenho a resolver, ou, até, para justificar que estes problemas não precisariam ser resolvidos. Divulgam-se, assim, apenas os dados que interessam…
Mais recentemente, este mesmo método está sendo utilizado para se afirmar que o Brasil “saiu melhor do que entrou” da recente crise econômica mundial… Será? Este artigo, de Cláudia Trevisan, mostra que temos muito a caminhar. Abaixo, um pequeno trecho:
O Brasil subiu impressionantes oito posições e foi apontado como uma das nações que devem sofrer menos com a crise atual, ao lado de China e Índia, que tiveram melhoras mais modestas no ranking, de apenas uma posição. Mesmo com o salto, o Brasil está em 56º lugar em um universo de 133 países pesquisados, atrás da China (29º) e da Índia (49º). Entre os BRICs, só a Rússa aparece em pior posição, 63ª.
Mas o que chama atenção na performance brasileira são os setores onde o país NÃO melhorou ou avançou muito pouco: educação primária, saúde e segurança, essenciais para mudar a maneira como a população experimenta sua vida cotidiana. Todas são áreas básicas, sem as quais o Brasil não poderá ir muito longe, por mais sofisticado que seja seu sistema financeiro e seu mercado de capitais.
No quesito saúde e educação primária, o Brasil permaneceu na mesma posição em que estava no ano passado, a 79ª em um universo de 133, atrás de países como México (65), Malásia (34), Tailândia (61) e Colômbia (72). Entre os BRICs, o Brasil está atrás da China (45) e da Rússia (51), ganhando apenas da Índia (101). O país aparece em 93º lugar no item segurança, dentro do qual o “crime organizado” nos coloca em 111º.
Como disse a economista Jennifer Blanke, uma das autoras do trabalho, o Brasil melhorou em áreas mais sofisticadas e avançou pouco ou nada nas mais elementares. O país ficou em 91º nos chamados “requisitos básicos”, que englobam instituições, infraestrutura, estabilidade macroeconômica e saúde e educação primária. É a pior posição entre os integrantes dos BRICs _a China aparece 36º lugar, a Rússia em 64º e a Índia em 79º.
“É difícil avançar no resto sem melhorar a qualidade da educação primária”, disse Blanke. O país também não avançou no quesito “educação superior”, ainda que registre posição mais alta, 58ª, a mesma que ocupava no ano passado.
Espero que, depois da Meta 2, seja possível avançar mais, e que a Justiça não seja medida apenas em números…
Às vezes penso que a justiça caminha como a educação e que é necessário uma reforma/revolução judiciária no Brasil. Outras vezes penso que apesar de tudo estamos caminhando e que nao é possível fazer alterações profundas da noite pro dia, ainda que seja triste e dê gastrite ver cotidianamente comportamentos do século passado ou até mais antigos. Porém, esses dois olhares se restringem à estrutura do poder e à organização burocrática e social. A qualidade, contudo, tem a ver também à saúde mental e social dos profissionais do direito e do direito como um todo. A litigiosidade é insalubre e não é inerente ao direito. Esquecemos que o conflito é normal, advem das diversidades e da complexidade e pior, esquecemos que o direito é sobretudo a pacificação social. Não proponho leis, mas mera reflexão e talvez disciplinas das faculdades de direito e políticas públicas fortes.
A meta 2 tem um única virtude, a de iniciar uma cultura de planejamento das atividades jurisdicionais. Porém, a meta tem que ser exequível. Por outro lado, vem causando um prejuízo aos processos posteriores ao ano de corte . Agora teremos a meta 3, 4, 5, 6, 7, 1000, sem, contudo, resolvermos problemas simples, por exemplo, exigir que os magistrados cheguem no horário e saiam ao final do expediente, de preferência estabelecendo um ponto eletrônico que indentifique o SERVIDOR JUIZ pela íris ou pelas digitais.
Falta comprometimento e respeito ao jurisdicionado. Pior do que um juiz que decide mal é um juiz que não decide.
Olá, Renzzo!
Concordo com Você.
Abraços,
medina
É, prezado Prof. Medina, a política da “produção em massa” (seja pela conhecida coação diária para a celebração de acordos, pela julgamento de recursos repetitivos, seja pelas súmulas vinculantes e/ou por aquelas impeditivas de recursos, etc), foi anunciada pelos tristes critérios objetivos de PROMOÇÃO DO MAGISTRADO já em 2004, conf. a EC45, que apesar de muitos não atentarem orientou pela a PRODUTIVIDADE e PRESTEZA no exercício da jurisdição como critérios necessários de evolução nas entrâncias. É uma tristeza deparar com esta tática que vem sendo adotada no Judiciário (como um trem desgovernado, p.ex., meta 2 CNJ etc) e mais parecendo uma “produção de pastel de feira” do que realmente um lugar de distribuição de Justiça. Então, cabe àqueles que têm algum poder em mãos tentar frear esta “bola de neve na ladeira” e vejo isso especialmente com a oportunidade de elaboração do Novo CPC, conto com o intelecto, ética e sentimento de Justiça seu e dos outros renomados colegas que fazem parte de tal comissão. São Paulo, SP, 29/nov/2009. Cezar A. Pinheiro
Obrigado, Cezar! De minha parte, farei o possível para que o anteprojeto seja o melhor para a sociedade!
Abraços,
medina
Não há dúvida que no afã de dar uma satisfação momentânea à sociedade brasileira muitas decisões direcionando para extinção de processos antigos, por certo, provocarão prejuízos enormes às partes.
Em vez disso, bastaria que os Juízes cumprissem os prazos que constam dos códigos de processo.
A morosidade se dá pela falta de planejamento e cumprimento constante de metas lógicas que deveriam ser pautadas no Judiciário.
Não há qualquer dificuldade em receber petições e juntar aos autos. Essa tarefa deveria ser urgente. Por outro lado, já há no § 4º do artigo 162 do CPC já autoriza ser praticado pelo servidor e revisto pelo Juiz os atos meramente ordinatórios. Com isso se agiliza em muito o andamento do processo.
Por outro lado, também deveria ser fiscalizado o horário de trabalho, inclusive dos Juízoes. Não resta a menor dúvida que se houver um constante cuidado na observação dos prazos processuais não seria necessário uma meta de excessão que, com certeza, provocará muitos transtornos a diversas jurisdicionados.
olá, professor!
Apesar das críticas, em parte, que vem sofrendo o projeto meta 2, proposto pelo CNJ, em parceria com os tribunais do brasil, creio que deve-se ver também os lados positivos do mesmo. Por exemplo, a informatização da justiça brasileira, que levará, provalvemente, a um ganho consideravel de tempo nos processos. Vejo o meta 2 como um “segundo passo” de uma longa caminhada a ser trilhada pelo país, que quer livrar-se da alcunha “país do futuro”. Conforme o próprio nome diz, tais objetivos são metas a atingir, e não soluções, ou seja, creio que o meta 2 apenas que indicar um caminho para se alcançar soluções para a morosidade na prestação jurisdicional. Mas, como o senhor mesmo declarou, há que tomar cuidado para que não se pretenda apenas alcançar números, deixando de lado o verdadeiro sentido da existência do Judiciário: apresentar respostas aos problemas do jurisdicionado.
abraços,
rafael dantas pereira.
A meta 2, alem de prejudicar,muitos idosos e familiares de idosos,que ja se foram,vai trazer a justiça um grande numeros de processos novos, e um grande prejuizo e trabalho a advogados,principalmente os antigos, que já não estão com a saude muito boa,para ficar enfrentando filas em cartoriopara tirar xeros,com a finalidade de instaurar, novos processos, com o mesmo pedido.
Olá, Helena!
Concordo com Você. De fato, vários problemas acontecerão, mesmo…