Bruno Dantas ressalta as vantagens de resolver os conflitos mediante a conciliação
Bruno Dantas, ministro-conselheiro do CNJ, concedeu entrevista ao Jornal A Tarde, de Salvador, na última sexta-feira (02/12), por ocasião da Semana Nacional da Conciliação. Na entrevista Dantas fala da atuação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e também sobre de que forma o novo Código de Processo Civil (CPC) pode contribuir para desenvolver a conciliação.
Qual é o motivo da presença deumconselheiro do CNJ na semana de conciliação?
O Conselho Nacional de Justiça temsido o principal incentivador da criação de uma nova cultura no Brasil que desincentiva as pessoas aperpetuarem litígios e incentiva a estabelecer diálogos e alcançar a solução para seus conflitos mediante a conciliação. Esta tem sido uma política que o CNJ encampou e que nós estamos hoje na sexta edição. A Semana Nacional de Conciliação já vem se realizando ao longo dos anos com sucesso, comum aumento paulatino da quantidade de audiências marcadas e realizadas, acordos obtidos e no valor homologado nestes acordos.
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Em 2010, marcamos aproximadamente 450 mil audiências. Dessas, realizamos cerca de 80%. Os outros 20% não foram realizados porque as partes não compareceram, não se conseguiu intimar o autor ou foi intimado e não compareceu, etc. Destas que foram realizadas, mais de 350 mil, tivemos um índice de acordos se aproximando de 50%,um número elevadíssimo.
O ano de 2010 terminou comum total de acordos homologados em R$ 1,1 bilhão, valores que poderiam estar ainda presos a processos, tramitando pelos escaninhos e pelo corredores da Justiça, e que os cidadãos tiveram acesso imediato. É renda que foi distribuída, direitos que foram garantidos de uma maneira abreviada. Este projeto da conciliação tem sido prestigiado pelo CNJ.
Estimulamos os tribunais a concentrarem audiências nesta semana, a realizarem um número maior do que realizam ordinariamente. Para prestigiar este esforço, mostrar ao cidadão e sensibilizar a sociedade sobre a importância da conciliação, os 15 conselheiros do CNJ se espalharam pelo Brasil e visitaram diversos estados. Eu fiquei incumbido de visitar a Bahia, que é meu Estado natal, e Alagoas, para prestigiar este esforço e também para conhecer projetos pilotos nessa área de conciliação.
O senhor foiumdos autores do novo Código de Processo Civil, cujo projeto tramita na Câmara. De que forma o CPC pode contribuir para desenvolver a conciliação?
A conciliação não depende apenas de uma ação, como a do CNJ de incentivo aos tribunais. É necessário também que ela seja prestigiada no bojo do processo. O projeto do CPC, que está em tramitação no Congresso, já aprovado no Senado e que está em tramitação na Câmara – e que tem como relator geral um baiano, o deputado Sérgio Barradas Carneiro (PT) – inverteu as etapas do procedimento no processo civil deslocando a audiência de conciliação para o início do processo. Aquela que era uma das últimas etapas do Processo passou a ser etapa inicial. Isso mostra a prioridade que é a conciliação.
E coloca a conciliação no momento em que as partes ainda não despenderam emoções, recursos financeiros ou tempo. Com este simples deslocamento, já é possível falar em um incentivo a mais para a criação de uma cultura de conciliação no Brasil. O código, portanto, aposta em métodos autocompositivos de soluções de conflitos.
Quais são as vantagens da conciliação?
Eu destacaria três, pois traz uma solução mais rápida, mais barata e mais satisfatória para as partes que estão brigando na Justiça. Mais rápida porque um processo que muitas vezes dependeria de produção de provas, de realização de perícia, de oitiva de testemunhas, é resolvido mediante a construção de um acordo por ambas as partes, com concessões recíprocas. Isso evita recursos, incidentes processuais e execução. É mais barato porque todos nós sabemos que para litigar na Justiça existem custas, é necessário contratar advogado. E é mais satisfatório porque uma decisão que é construída pelas duas partes é muito mais aceita do que uma decisão imposta por um juiz, onde sempre vai existir um insatisfeito que vai buscar um recurso que adia o cumprimento da decisão.
Isto também serve para desafogar a Justiça, que tem fama de lenta, não?
Sem dúvida. Para o Estado, existe uma grande vantagem também que é a diminuição do custo. A tramitação de um único processo aqui na Bahia custa, em média, R$ 1,7 mil para o Estado. Um processo que se encerra na sua fase inicial ou em que as partes chegam a um acordo e nem se inicia poupou o Estado deste gasto. Para o Poder Judiciário, existe um ganho extraordinário que é o desafogamento das varas judiciais. Os juízes, no momento em que se obtém a conciliação e o processo desaparece, tem condições de dedicar a atenção para casos mais complexos, nos quais o acordo é inviável. Em vez de gastar horas para despachar um processo que pode ser encerrado num acordo, o juiz poderá otimizar seu tempo.
O ministro Gilson Dipp declarou que “para a Justiça baiana ficar ruim teria que melhorar muito”. O senhor compartilha dessa opinião?
Existem algumas questões estruturais que precisam ser conhecidas pela população antes de se fazer um diagnóstico sobre o Poder Judiciário. Eu não estou dizendo com isso que a Justiça baiana é boa ou ruim. Estou dizendo que, para se fazer uma análise completa, é necessário ter todas as variáveis em jogo. E aí eu dou alguns exemplos. A Justiça baiana tem um déficit histórico de investimentos. Isso se reflete, de certa forma, em um dado alarmante. A Bahia tem a menor quantidade de juízes para cada 100 mil habitantes do Brasil. A média nacional é de 6,5. Eu poderia citar países desenvolvidos em que a média é de 25 juízes por 100 mil habitantes. A Bahia tem quatro. É um número alarmante.
A que se deve isso?
Evidente que é necessário que se dediquem mais recursos públicos, mas como fazer isso se o Judiciário baiano já extrapolou o coeficiente da Lei de responsabilidade Fiscal, que é de 5%? Eu não compartilharia com esta opinião de que para ficar ruim tem que melhorar muito, mas acho que há muito o que melhorar. Com investimento público, gestão pública e com algo que o tribunal da Bahia vem fazendo com algum pioneirismo, que é buscar soluções criativas para o seu déficit de orçamento.
O senhor poderia citar uma?
O projeto de conciliação em matéria tributária. Permite que o contribuinte regularize sua situação fiscal, que o Estado receba aqueles recursos que já deviam estar nos seus cofres, e que o Poder Judiciário se veja livre de um processo que provavelmente tramitaria anos a fio, ocupando as prateleiras do tribunal. Os dados do CNJ mostram que a Bahia tem melhorado na sua gestão. Em 2010, o número de processos arquivados é superior aos que ingressam. Ou seja, a Bahia está diminuindo seu estoque. Está acelerando a solução destes processos que estavam nos escaninhos, e isso mostra uma melhoria. De modo que me parece que existem motivos para o povo baiano ter esperança de que sua Justiça está melhorando e vai melhorar ainda mais.
Qual é a opinião do senhor sobre declaração da ministra Eliana Calmon, de que há bandidos de toga?
Se a ministra Eliana Calmon errou por excesso, não disse nenhuma mentira. Todos sabem que existem bandidos de toga, assim como existem bandidos de gravata, como advogados, bandidos com roupa de médico, e bandido sem todas as profissões. O que me parece é que a ministra Eliana Calmon poderia ter feito a ressalva necessária de que a esmagadora maioria dos juízes brasileiros é honesta, dedicada.
Os juízes brasileiros são sérios, devotados, trabalhadores e são honestos. Faltou naquela declaração da ministra este reparo. E me parece que um corregedor nacional de justiça, que tem todos os instrumentos para apurar, processar e punir aqueles juízes que praticam desvios, poderia apresentar sociedade os nomes destes juízes.Entendo que talvez a ministra tenha sido eloqüente demais, mas não falou nenhuma mentira. Todos nós sabemos que em qualquer profissão existem as maçãs podres que precisam ser extirpadas para não contaminar a imagem das maçãs sadias.
E quando se fala em Judiciário, a honorabilidade dos seus membros é o patrimônio mais importante. Uma sociedade que não acredita em seu Poder Judiciário vai acabar se socorrendo à justiça com as próprias mãos, o que acaba indo para a barbárie. Estes casos precisam ser extirpados rapidamente, e, neste ponto, a ministra tem feito um trabalho digno de aplauso, que vem sendo reconhecido pela sociedade brasileira.
O senhor concorda com a proposta de retirada das iniciais dos juízes nos processos em que eles respondem?
Posso dizer que sou contra este movimento que existe hoje, mais um a vez capitaneado pela AMB, de subtrair do conhecimento da população as iniciais dos juízes que respondem a processos. O Supremo Tribunal Federal há de dizer se este sigilo que existe na Loman foi ou não recepcionado pela Constituição.
A pena máxima aplicada a um magistrado que tenha comprovadamente praticado algum malfeito é a aposentadoria. Não é uma punição muito branda?
Eu penso que não é possível falar que a aposentadoria compulsória é um prêmio porque se trata de banimento de um juiz da carreira. Mas eu tenho refletido muito sobre este assunto e venho a me questionar se seria razoável que a legislação previsse a um juiz corrupto, que vendeu uma sentença, portanto que violentou o juramento que fez ao assumir a magistratura, e colocar este juiz na mesma situação de outro que passou a vida inteira se dedicando à causa pública. É algo que agride o senso comum, agride a imagem que a sociedade tem do que deve ser a atividade estatal. Para que o Judiciário esteja em sintonia com o que a sociedade deseja, e é importante que seja, penso que esta discussão merece ser aprofundada no Congresso. Há algumas propostas de emenda constitucional tramitando, algumas permitindo que o CNJ possa punir com demissão juízes corruptos. Penso que esta pode ser uma boa solução, pois CNJ está distante dos fatos e tem condições de julgar com neutralidade, com imparcialidade. A síntese disso é que este tema está colocado no fórum apropriado, que é o Congresso Nacional.
fonte: Jornal A Tarde.
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