Sentença do Caso Vladimir Herzog

Em notícia publicada no blog do Professor Madeira, o juiz e professor da Mackenzie expõe uma decisão importante para a luta do Direitos Humanos no país. Nessa recente decisão,  a Justiça manda corrigir a causa da morte do jornalista  em certidão de óbito.

Eis o julgado:

Trata-se de expediente relativo à retificação da anotação da causa morte, no assento de óbito do jornalista Vladimir Herzog, por iniciativa da Comissão Nacional da Verdade, representada pelo Coordenador Ministro Gilson Langaro Dipp, incumbida de esclarecer as graves violações de direitos humanos, ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988, nos termos da Lei n. 12.528, de 18 de novembro de 2011, instaurado por solicitação da viúva Clarice Herzog, dado o esclarecimento da verdade de que a morte do então marido da requerente não decorreu de suicídio, mas em consequência de lesões e maus tratos sofridos em dependência do II Exército – SP (DOI-CODI).

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Tendo em vista a deliberação da referida Comissão, que conta com respaldo legal para exercer diversos poderes administrativos e praticar atos compatíveis com suas atribuições legais, dentre as quais recomendações de “adoção de medidas destinadas à efetiva reconciliação nacional, promovendo a reconstrução da história” (Ofício n. 100/2012-CNV), à luz do julgado na Ação Declaratória (Proc. 136/76), que passou pelo crivo da Segunda Instância, com o reconhecimento da não comprovação do imputado suicídio, fato alegado com base em laudo pericial que se revelou incorreto, impõe-se a ordenação da retificação pretendida no assento de óbito de Vladimir Herzog.

Na sistemática legal vigente, o assento de óbito deve conter a indicação sobre “se a morte foi natural ou violenta e a causa conhecida, com o nome dos atestantes” (art. 80, § 8º, da Lei de Registros Públicos).

Se a anotação resultou de erro ou engano, por indicação equivocada do declarante, ou por irregularidade ou imprestabilidade do laudo pericial que lhe deu suporte, a posterior constatação de falha legitima a retificação, precipuamente, como na hipótese, em que a ocorrência veio a ser apreciada pela via jurisdicional, em ação declaratória proposta com a finalidade de se obter reparação a título de responsabilidade civil da União, cujo desfecho, no aspecto principal, foi favorável à viúva do jornalista encontrado morto no estabelecimento militar do DOI-CODI, prevalecendo a conclusão de que não se comprovara o fato alegado do suicídio (asfixia mecânica por enforcamento).

A objeção parcialmente oposta pela ilustrada Promotoria de Justiça, no que se refere à anotação da causa da morte, a despeito da firme argumentação invocada, não procede.

Seria verdadeiramente iníquo prolongar o martírio da viúva e dos familiares e afrontar a consciência pública nacional, a renovação da investigação sobre a “causa mortis”, quando, de há muito, ficou apurado, em termos de convicção inabaláveis, especialmente, pela via jurisdicional comum, que o jornalista Vladimir Herzog perdeu a vida em razão de maus tratos e de lesões sofridas, em circunstâncias de todos conhecidas.

Apegar-se a filigranas jurídicas, na conjuntura apontada, constituiria o reconhecimento inadmissível da continuidade do sofrimento imposto pela imputação de suicídio, cuja versão não foi comprovada segundo definição judicial precedente.

A Comissão Nacional da Verdade já assentou o entendimento em relação à matéria, sobre a qual não há mais o que perquirir, nesse particular.

A referência contida na manifestação de fls. 09 não diz respeito à reabertura de investigação instaurada anteriormente, para apuração da morte de Vladimir Herzog, no DOI-CODI-SP, mas corresponde à solicitação da Assessoria à Comissão Nacional da Verdade da remessa dos respectivos autos para “apreciação dos demais pontos do requerimento da interessada” (fls. 09, “in fine”), sem afetar a questão no âmbito registrário.

A matéria, portanto, reclama o restabelecimento da verdade para adequar, “ainda que tardia”, a ocorrência ao estado de exatidão.

Destarte, pelos fundamentos expostos, acolhida a manifestação da digna Comissão Nacional da Verdade, defiro o pleito proposto, para o fim de ordenar a retificação no assento de óbito do jornalista Vladimir Herzog, para constar que a morte decorreu de lesões e maus tratos sofridos em dependência do II Exército – SP (DOI-CODI).

Após o trânsito em julgado, expeçam-se as diligências necessárias.

ESTA SENTENÇA SERVIRÁ COMO MANDADO, desde que por cópia extraída pelo setor de reprografia do Tribunal de Justiça, assinada digitalmente por este Magistrado e acompanhada das cópias necessárias ao seu cumprimento, inclusive da certidão de trânsito em julgado, todas numeradas e rubricadas, com certidão abaixo preenchida pela Sra. Coordenadora ao Sr. Oficial da Unidade do Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais do 7º Subdistrito da Capital, para que proceda à retificação deferida.

Ciência ao Ministério Público.

Comunique-se a decisão à Comissão Nacional da Verdade e à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, para conhecimento.

Oportunamente, arquivem-se os autos.

P.R.I.C.

São Paulo, data.

MÁRCIO MARTINS BONILHA FILHO

Juiz de Direito

fonte: Blog do Madeira por Guilherme Madeira Dezem.

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