STF, Câmara e efeitos do julgamento do “mensalão”
Em artigo publicado no site Folha de São Paulo, o Ministro Marco Aurélio Mello trata da perda do mandato dos parlamentares condenados e demais efeitos da Ação Penal n.º 470.
Eis o artigo:
A ordem natural das coisas possui força insuplantável, norteando a vida em sociedade. Prevalecente o bom senso, conclui-se que servidor ou agente condenado por formação de quadrilha, corrupção, peculato ou lavagem de dinheiro há de ser afastado da administração pública.
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Em um Estado democrático de Direito, imperam as normas legais, a que todos, indistintamente, submetem-se. O Código Penal versa os efeitos da condenação, estando prevista, em certas situações, a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo -artigo 92. Isso ocorre quando aplicada pena restritiva da liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados em violação de dever para com a administração pública. Os direitos políticos ficam suspensos ante condenação criminal, enquanto durarem seus efeitos -artigo 15, inciso I, da Constituição Federal.
Considerando o sistema como um grande todo e o primado do Judiciário, fica afastada a possibilidade de quem quer que seja desconhecer ou mesmo flexibilizar decisão condenatória. É comum dizer-se que o teor não se discute. Deve apenas ser cumprido.
O Supremo, no julgamento da ação penal nº 470, concluiu no sentido da perda dos mandatos dos parlamentares condenados -e estes o foram, repita-se, por formação de quadrilha, corrupção passiva, peculato ou lavagem de dinheiro-, declarando-os inabilitados para o exercício de função pública. Entre as interpretações possíveis, incumbe relativizar a verbal, a gramatical, que, conduzindo à visão primeira, seduz.
A sistemática e o objetivo das normas são inafastáveis. Por isso, o artigo 55 da Carta de 1988, mais precisamente o § 2º nele contido, ao revelar que, nos casos de inobservância às proibições versadas no artigo anterior, de procedimento incompatível com o decoro parlamentar e de condenação criminal, a perda do mandato pressupõe votação secreta e maioria absoluta assim definindo, não pode ser levado às últimas consequências, mesmo porque o parágrafo que se segue, a alcançar perda do mandato assentada pela Justiça Eleitoral, versa não a deliberação, mas a simples declaração pela Mesa da Casa respectiva.
O sistema não fecha se admitido o tratamento diferenciado. Depois de selada a culpa de parlamentares condenados, com imposição da perda dos mandatos, quando não mais for possível a interposição de recurso contra o pronunciamento do Supremo -respeitando-se, nesse meio-tempo, o princípio constitucional da não culpabilidade-, o efeito será único: o afastamento definitivo do exercício dos mandatos.
A toda evidência, a decisão proferida não se mostra, sob o ângulo da eficácia, condicionada ao endosso de órgão de outro Poder. Alfim, o Supremo, guarda maior da cidadania, da Constituição da República, o qual possui a última palavra sobre o direito posto, limitou-se a observar a ordem jurídica.
No mais, os ares democráticos direcionaram ao pleno funcionamento das instituições, sendo impensável a resistência ao conteúdo de título executivo criminal condenatório. Cientificada a Câmara dos Deputados do denominado trânsito em julgado da decisão -do não cabimento de qualquer recurso-, a providência natural situa-se no campo da forma: a declaração da perda dos mandatos, convocando-se, para as cadeiras vagas, os substitutos diplomados pela Justiça Eleitoral.
fonte: Folha de São Paulo, por Marco Aurélio Mello.
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