STJ começa a conter julgamento de recursos repetitivos
Valor Econômico, por Saul Tourinho LealA reportagem a seguir foi publicada no site do jornal Valor Econômico, em 11.09.2013:
‘O Ministro Napoleão Maia, do Superior Tribunal de Justiça, emplacou, na sessão de hoje da 1ª Seção do Tribunal, uma contenção aos julgamentos submetidos à sistemática dos recursos repetitivos (previstos no art. 543-C do Código de Processo Civil), cuja decisão vincula – direta ou indiretamente – todo o Judiciário.
A 1ª Seção estava prestes a proferir decisão, em recurso repetitivo, sobre o direito a reincorporação da gratificação de horas extras. A maioria formada mudaria a jurisprudência do STJ. Era uma maioria apertada: 5 x 4. Na iminência da proclamação do resultado, o ministro Napoleão pediu a palavra: “Presidente, acho que os recursos repetitivos deveriam confirmar uma jurisprudência, não desafiá-la. Além disso, não temos uma maioria confortável ou folgada”. O ministro Castro Meira, que presidia o julgamento na sua última sessão ali (aposenta-se nos próximos dias) concordou, remetendo a questão à apreciação dos colegas, qual seja: saber se, em razão da alteração jurisprudencial e, também, da maioria apertada, era o caso de se afastar a prerrogativa dos recursos repetitivos e se valer, somente, do precedente simples.
O ministro Herman Benjamin esclareceu que a finalidade era impedir que as matérias ficassem eternamente sem pacificação jurisprudencial e que aquela proposta acabava com o benefício mais importante do instrumento. Em seguida, afirmou que não estava preparado para contrapor a proposta do ministro Napoleão: “Fui pego de surpresa”, disse. O ministro Sérgio Kukina também estranhou: “A legislação fala em demandas múltiplas, não em precedentes múltiplos do STJ num dado sentido”. Ele perguntou: “E se tivéssemos o contrário? Um placar de 5 x 4 confirmando uma jurisprudência. Também retiraríamos o caráter repetitivo da demanda?”. A resposta que obteve foi fluida: “Quando isso ocorrer a Corte delibera”, encerrou o ministro Meira. Para finalizar, o ministro Napoleão propôs um quorum sem o qual não seria possível decidir uma questão pela sistemática dos recursos repetitivos: dois terços dos membros da 1ª Seção. Se o julgamento não alcançar esse número, o precedente será simples.’
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Processo Civil Moderno, volumes 1, 2, 3 e 4
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‘O resultado foi o acolhimento da proposta por unanimidade. Afastou-se o caráter repetitivo da controvérsia, retirando-se o caso, assim, da metodologia do art. 543-C do CPC. Semana passada, vimos que o ministro Napoleão Maia já alertava para sua intenção de suscitar mais comedimento na utilização desse instrumento processual. Hoje, saiu-se vitorioso com o apoio de todos os colegas, mesmo daqueles que, de alguma forma, enxergaram possíveis efeitos colaterais em sua proposta.
O princípio que ilustra a decisão acima é o da prudência. Esse princípio não é estranho aos tribunais. Desde o século XIX várias Cortes norte-americanas optam, por exemplo, por não declarar leis inconstitucionais quando o resultado da votação se der pela maioria do quorum mínimo de juízes. Thomas Cooley entende tratar-se de uma prudente e apropriada precaução a ser observada antes de ingressar em questões delicadas e importantes. Seria um comedimento sem previsão legal ou, mesmo, regimental.
Quanto à proposta do quorum mínimo de dois terços, apesar de a 1ª Seção não ter se pronunciado a respeito, vale recordar que esse é o quorum que o Supremo Tribunal Federal exige para utilizar os seus mais importantes instrumentos: (i) rejeição de repercussão geral; (ii) concessão de modulação de efeitos; (iii) e aprovação das súmulas vinculantes. Fonte de inspiração, pelo menos, a proposta tem.
Um último ponto que merece reflexão é o da possibilidade de a 1ª Seção, contudo, não conseguir seguir a risca essa regra de prudência. A experiência norte-americana mostra que nem sempre é possível firmar maiorias folgadas ou quoruns cheios em decisões judiciais colegiadas. Em 1870, a Suprema Corte declarou a inconstitucionalidade, por 4 x 3, do Legal Tender Act (caso Hepburn v. Griswold, 1862). Na época, o Tribunal tinha nove assentos. Em 1982, manteve, num placar de 4 x 4, a declaração de inconstitucionalidade de uma lei, proclamada na instância ordinária(Common Cause v. Schimitt).
O benefício da regra de comedimento é a sua flexibilidade. Contudo, o seu maior problema é exatamente esse caráter flexível, que pode abrir espaço para casuismos que rompem que a ideia de isonomia, segundo a qual, todos devem contar com a mesma consideração e respeito por parte do Judiciário.’
Fonte: Valor Econômico
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