O Tribunal de Guantánamo…em que século estamos?
Em artigo publicado no blog Dimensão Constitucional, a professora Carina Gouvêa discute um polêmico tema do cenário jurídico internacional. Trata-se do Tribunal de Guantánamo, onde serão julgados os não cidadãos acusados de terrorismo e será composto por juízes militares americanos.
Eis o artigo:
A prisão de Guantánamo está localizada no sudoeste de Cuba, sob a administração dos Estados Unidos. O acordo celebrado entre os países, possibilitou aos Estados Unidos controlar e realizar operações navais na base. Após o ataque terrorista de 11 de setembro de 2001 ocorrido nas cidades de Nova Iorque e Washington se tornou o centro de detenção de acusados de envolvimento com o terrorismo. O grupo responsável pelo ataque foi a Al-Qaeda – Organização Fundamentalista Islâmica constituída por células colaborativas e independentes que visa, também, reduzir a influência não islâmica.
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Estima-se que a prisão possui 779 pessoas detidas. O objetivo é a obtenção de informações privilegiadas [2]. Há ainda registros de violações dos Direitos Humanos como tortura, transporte inadequado de detentos, abuso sexual, espancamentos, intolerância às práticas religiosas, detenção de crianças, dentre outros.
A maioria dos detentos são de origem afegã, paquistanesa e iraquiana e estão detidos sem acusação formal e julgamento.
Apesar das pressões internacionais como a da Cruz Vermelha, da Anistia Internacional, da ONU, que requerem o fechamento imediato da prisão e das promessas de Barack Obama, a mesma continua a existir e indivíduos permanecem detidos arbitrariamente em clara violação ao direito internacional e humanos.
Controvérsias ainda em construção, como o recente recurso encaminhado ao Tribunal Federal onde o departamento de Justiça dos Estados Unidos acusou uma juíza federal de Nova York de “intrusão judicial extraordinária e injustificada em matéria de responsabilidade constitucional dos Poderes Executivo e Legislativo”.
O governo Obama solicitou a suspensão temporária da decisão proferida pela Juíza de Nova York que considerou inconstitucional uma lei que autoriza detenções de suspeitos de terrorismo por tempo indeterminado, sem acusação formal e julgamento[1].
Para processar e julgar os detidos em Guantánamo o Congresso americano criou o Tribunal de Guantánamo, onde serão julgados os não cidadãos acusados de terrorismo e será composto por juízes militares americanos.
De acordo com o Promotor-chefe de Guantánamo, o Brigadeiro-General Mark Martins [3] o tribunal será “imparcial” e “os jurados militares provenientes de unidades em todo o mundo serão escolhidos porque são os mais qualificados para o dever em razão da idade, formação, educação, experiência, tempo de serviço, e temperamento judicial”.
Em que pese o julgamento dos detidos e acusados formalmente será aplicada a Constituição Americana?
Em depoimento, o juiz militar James Pohl [4] se manifestou no sentido de que deve-se lidar com os desafios constitucionais de forma individual e conforme forem surgindo. Serão julgados cinco homens acusados de tramar os ataques de 11 de setembro. O assunto surgiu em uma audiência de pré-julgamento em os réus poderiam ser sentenciados a pena de morte.
Críticos têm alegado que a base de Guantánamo foi escolhida pelo então Presidente George W. Bush, porque acreditava que assim, a lei americana não alcançaria os seus detidos. A Suprema Corte decidiu em 2008 que, embora eles não sejam cidadãos e tenham sido detidos fora dos Estados Unidos tem a garantia constitucional do “habeas corpus”. Ou seja, de contestar sua detenção na justiça e que os Estados Unidos tem “soberania de fato”, porque a base cubana está inteiramente sob controle dos EUA. Não se sabe ainda se os detentos terão direitos constitucionais como o devido processo legal, de não ser submetido a punição cruel e incomum, ou o direito de ampla defesa e contraditório, conforme noticiado.
O Procurador Barro Trivett afirmou que quando o congresso aprovou a lei, claramente, não tinha a intenção de conter todos os direitos que teriam se fossem os réus julgados em Tribunais Federais dos Estados Unidos sob a égida da constituição americana.
Importante mencionar o Tribunal Penal Internacional, com jurisdição universal, criado pelo Estatuto de Roma de 1998 tem por objetivo primordial punir e responsabilizar individualmente os piores e mais bárbaros crimes que ocorreram contra a humanidade e sua dignidade, assegurando aos acusados um julgamento justo.
Os marcos que antecederam a instituição do tribunal, foram os tribunais ad hoc criados pelo Conselho de Segurança da ONU para os países que estavam em conflito, como o Tribunal e Nuremberg e Tóquio e Ruanda, a partir das duas grandes guerras.
O Tribunal Penal Internacional possui cento e vinte Estados-partes, que assinaram o estatuto, incluindo os Estados Unidos e possui 111 ratificações aceitando plenamente a sua jurisdição, pois não cabe ratificações com reservas.
Regulado pelo princípio da complementariedade e com competência para julgar os crimes de genocídio, de agressão, crimes contra a humanidade e crimes de guerra, é constituído por 18 juízes de várias nacionalidades e é imparcial!
Os acusados detidos em Guantánamo não poderiam ser submetidos ao presente Tribunal por questões como: os Estados Unidos apesar de assinar o estatuto não ratificou; a competência ratione temporis, a vigência do tribunal iniciou-se a partir de 1º de julho de 2002 e os ataques ocorreram em 2011; o “crime de terrorismo” não tem tipificação própria no estatuto.
Mas, terrorismo não poderia ser considerado um crime contra a humanidade? Conforme o estatuto este crime está vinculado a um contexto de conflito armado internacional ou interno, o que não englobaria as acusações apresentadas. Será que vale uma revisão?
Apesar das possíveis atrocidades cometidas pelos acusados…sustentar a possibilidade de os acusados não terem direitos humanos e fundamentais mínimos garantidos e um julgamento justo, me faz indagar em que século estamos?
[1] Guantánamo. [imagem online]. Disponível em < http://www.valinor.com.br/7709/>. Acessado 21 de out 2012.
[2] Informações obtidas através dos Wikileaks no ano de 2011. Disponível em < http://www.telegraph.co.uk/news/worldnews/wikileaks/8471907/WikiLeaks-Guantanamo-Bay-terrorist-secrets-revealed.html>. Acesso em abr de 2011.
[3] U.S. Department of Defesa. Judge Postpones 9/11 Hearings as Guantanamo Prepares for Storm. Disponível em < http://www.defense.gov/news/newsarticle.aspx?id=117601>. Acesso em 20 de out de 2012.
[4] Migalhas Internacional. Judge in 9/11 case weighs whether Constitution applies at Guantanamo. October 19, 2012 nº 1,239 – Vol. 10.
fonte: Dimensão Constitucional, por Carina Gouvêa
Reblogged this on Alexandre Melo Franco Bahiae comentado:
Artigo sobre o non sense jurídico que é a prisão de Guantánamo e o tratamento (a)jurídico dado àqueles presos pelos EUA.